26 de abr. de 2016

SETENTA PARABÉNS

comecei o ritual comendo sal antes do bolo. hambúrger com cheddar, que eu não queria comer, mas. o fiz porque achei que eu merecia comer cheddar só porque era meu aniversário. e refrigerante. água com açúcar, melhor dizendo. antes de steve jobs chamar refrigerante assim, eu nunca havia me dado conta de que é só água com açúcar mesmo hehe. sozinho na doceria, eu comecei a ter problemas para engolir a fatia de bolo que comprei, claro, pois se eu comprasse um bolo inteiro, por menor que fosse, daria trabalho para leva-lo para casa. não dirijo. não tenho carro. os supermercados e as padarias ficam longe de casa e eu teria tanto trabalho para então jogar fora a maior parte do bolo, pois ninguém me ajudaria a come-lo. 'teve festa?' o gabriel perguntou e eu 'por que teria? você iria se tivesse?' 'se você me convidasse, eu provavelmente iria'. (...)

eu ainda tenho em alguma caixa, as fotos do meu aniversário de dez anos de idade. minha mãe encomendou um bolo bem grande, com o piu piu desenhado. nas fotos, é possível me ver soprando a vela, minha irmã, meus primos, as crianças que eu brincava junto na rua, esperando para comer o bolo. há também uma foto minha na cama, com os meus presentes, tinha um crucifixo na parede, quando ainda acreditávamos que jesus andou pela água, que jesus andou pela terra. difícil hoje aceitar que coisas assim não vão mais acontecer, os parabéns, o bolo, a família, os amigos, minha mãe sequer me ligou no meu aniversário, mandou um whatsapp, ela deve ainda estar chateada porque não fui á festa de aniversário do meu pai no mês passado. bem, eles fizeram a festa na segunda-feira á noite! que tipo de gente faz festa de aniversário na segunda-feira á noite? pessoas que não estudam e não trabalham, claro, aqueles amigos septuagenários do meu pai. eu não preciso de uma ligação, uma surpresa. não estou surpreso que não importa que estou deprimido e paranóico, não, tudo o que importa nesse momento é que o casamento da minha irmã não vai bem. é melhor eu me contentar com os setenta parabéns que recebi no facebook.

depois de comer o bolo, eu fui para casa abrir os presentes que eu mesmo comprei. um CD com nelson freire tocando chopin e um livro da adília lopes. claro que não ganhei um homem para passar pomada nas minhas costas, como postei no facebook. pois é que não consigo fazer isso muito bem sozinho, sabe? pomada para dor, pomada para acne. bem, a essa altura as acnes envelheceram e nem mais acnes são, viraram manchas já e. bem, eu não vou ter homem nenhum até que eu aprenda a sorrir, a ser simpático, até que eu aceite os convites para eventos sociais. bullshit. bullshit. se aquele garoto me quisesse, eu sorriria, não acho que necessariamente eu preciso voltar a sorrir para que 'o universo' sorria de volta para mim. bullshit. bullshit. como é sexy a forma como ele lança a medicine ball na parede, não? muito, mas é muita areia para o seu caminhãozinho. justo, e eu não vou abordar ninguém, visto que minha auto estima já está um caco. é melhor eu focar no meu treino, pois minha perninha está bem forte e logo logo, eu vou saltar seis metros. talvez eu deveria prestar mais atenção nos garotos que vem conversar comigo no vestiário. o episódio do aniversário, me faz lembrar de uma parte sobre o aniversário que está no primeiro capítulo do meu romance novo, que estou desenvolvendo. vou compartilhar com vocês logo abaixo:

***

                São Paulo, Brasil, 1995: Uma Desobediência.
         A semente do mal estava plantada. A semente do mal estava plantada em mim.
      Você sabe a parte boa e a parte ruim de ser um idiota? A vulnerabilidade, é claro. Sendo um, você pode ser facilmente oprimido e acorrentado, mas também pode ser facilmente convencido a praticar o mal, a desobediência, o deboche e a fálica visão política ou “cegueira política”, se assim o queira.
         A planta que eu viria a ser crescida era exótica e nunca iria dar nenhum fruto. Você sabe do que estou falando, não?
         Ó meu deus, como estive quieto por tantos anos. Como chutei a bola para fora do gol. A treinar futebol e ter de aceitar aqueles garotos me insultando no treino. Eu nunca pude responder porque há algo, algo dentro da minha boca que me detém, detém a palavra mas: naquele dia, naquela quente dia eu teria uma voz, foi o que eu pensei quando dei o sinal para o ônibus.
         E isso é um sonho.

         Um homem e uma mulher. Um homem. E uma mulher. Não eram bem as bíblias de bolso que eram distribuídas nas escolas públicas nos anos 1990. Sim, fizeram isso. Nesse laico estado. Nesse hipócrita estado. Nesse tolo estado. Nesse selvage estado. Até que não é estado, na prática. Bem, não eram as bíblias de bolso, mas eram as mentes, as mentes daquela comunidade, daquela comunidade suburbana, era meus pais, o homem da padaria. Um homem e uma mulher; e se você não pode ser um homem, então você só pode ser uma mulher e foi como eu pensei que eu deveria ser uma mulher, ou me tornar uma aos doze, entende?
         Um homem árabe? Um homem árabe ensinando catecismo? Um homem árabe ensinando catecismo para crianças? Soa estranho, mas não soa estranho desde que esse não é um estado, mas habitat do homem neolítico, talvez. Pedofilia não soava assim tão mal porque eu sabia já o que era o sexo aos doze e eu queria muito, mas muito ser tocado por aquele homem árabe professor de catecismo.
         E isso é um sonho.

         Desculpe, sinto muito desapontar todos vocês. Mas não rolou. Pois eu era um freak na essência e para mim estava ok morrer naquele momento. Pois eu estava apenas apaixonado por aquele homem e eu podia fazer qualquer coisa por ele, o que ele me pedisse. Além de ser um idiota, eu era um adolescente e é assim que os adolescentes amam.
         Homem árabe: Tem certeza que você quer fazer isso?
         Eu: Tenho.
         Quer saber? Não há mesmo razão para alguém fazer algo assim. Assim como não há explicação lógica para o amor, se você pensar racionalmente. Eu já andava meio triste desde o meu aniversário em onze de abril, quando meu pai passou o dia fingindo que não era meu aniversário e quando eu perguntei sobre meu presente ele respondeu, rude como sempre, para que eu não o perturbasse e me deu dinheiro para que eu comprasse a droga do presente, e a pior parte disso tudo é que eu de fato comprei o presente. Eu era uma criança imbecil, capitalista e materialista, do contrário eu deveria ter dito para ele enfiar aquele dinheiro no cu. Ele quebraria meu maxilar, mas ok, é assim que se aprende a se expressar de acordo com o que se pensa e o que se acredita, mas eu não era capaz de pensar e/ou acreditar naquela época. E também eu fiquei tão tocado pelo que aconteceu em Oklahoma City dias depois que eu...
         Bem, se a última refeição da sua vida, no corredor da morte não pode custar mais do que vinte dólares então por que eu deveria ter dinheiro para gastar no aniversário, não?
         Sim, entrei em um desses ônibus cheios de São Paulo com o colete de bombas e matei um monte de gente como prova de amor ao homem árabe e de ódio ao estado, seja lá o que isso signifique.
         E isso é um sonho.

***


XOXO 

18 de abr. de 2016

OS DIAS QUADRADOS

amanhã:
-há mais de dez dias estou tomando essa mesma medicação e ainda me encontro um tanto depressivo e com ideias suicidas. Sei que você deve estar se perguntando ‘por que você não se mata logo, então?’ (sei que você jamais se perguntaria isso, pois você é o psiquiatra e. sim, pois é a pergunta no qual a resposta dá sequência ao diagnóstico). por causa do fio de esperança. este ano. este ano de 2016. vou aguardar o desenrolar para ver se terei algum reconhecimento pela minha pobre literatura. pobre de sofrida, não pobre de ruim. quero vestir um terno roxo para comemorar essa dolorida literatura, porque o roxo é a cor da dor. não vou. não vou deixar a minha mãe abrir a boca para sugerir o que vou vestir.

o que o psiquiatra novo com aquele rostinho bonito vai sugerir, então? dobrar a dosagem? sim, bonito ele. dobrar a dosagem. só dobrar, pois eu já disse a ele que tenho a sensação constante de estar enlouquecendo mas. o que dizem é que quando uma pessoa enlouquece, ela nunca percebe. logo, se estou desconfiando que estou louco, então isso significa que não estou louco.

sim, só mais este ano. não vou tolerar outros. filho, filho, por que você está usando roupa preta há quatro dias seguidos? porque estou de luto pelo meu marido que morreu afogado no mississipi. ah é mesmo, filho, tinha me esquecido. blah; na verdade o trecho acima é parte do meu quinto livro, o romance e. não preciso, não preciso me preocupar para querer fazer algo grande, ou algo excelente pois: eu vou fazer o que eu faria, é só dar sequência, eu não vou fazer nada que eu não faria, só serei eu mesmo e. terminei o dolorido e louco primeiro capítulo onde revisito a minha vida passada (eu era uma garota chamada ‘julia’ e vivi nos anos de 1960 em uma cidadezinha no interior da inglaterra chamada 'ipswich') e minha pré-adolescência, meus doze anos, mais precisamente e.

O fio. O fio de esperança. ás vezes ele parece de mel e ás vezes de algodão, entende? tão grudento e ameaçadoramente eterno ou frágil, terrivelmente frágil. não é um corpo se debatendo no mississipi. os dias quadrados... eu costumava fazer um círculo em cima de cada dia no meu calendário de papel, mas há sete dias passei a desenhar quadrados em volta deles.


XOXO

3 de abr. de 2016

A HABILIDADE DE FINGIR

A Técnica:

eu pensava que era só o sono após o almoço, pensei que era só o romance que estou escrevendo, aquele que relembro muito da minha adolescência, da minha infância e até mesmo da minha vida passada; escrevo sobre isso alguns minutos e então sinto vontade de chorar após ver o que escrevi. eu não chego a chorar, mas fico com falta de ar por alguns momentos mas. não, eu tomo um comprimido de alprazolan logo após o almoço todos os dias e isso tem se tornado um hábito. eu tomo porque eu sinto medo, desespero e uma intensa vontade de chorar (que nunca se concretiza em choro, claro). aliás, nem posso chorar no escritório mas. mesmo se eu pudesse, eu não o faria  por não conseguir. acho que é por causa da minha excelente habilidade de fingir e é isso o que separa pessoas loucas de pessoas normais, acho. eu ainda sou muito gentil quando as pessoas falam comigo, eu tento ainda bastante ser gentil até mesmo com as pessoas que não gosto, e ainda sorrio enquanto converso mesmo me sentindo tão mal por dentro. acho que isso engana meu corpo, engana meu cérebro. meu cérebro deve pensar “se ele está sorrindo, se está sendo gentil, então ele não quer chorar”.

é quinta-feira, a esquerda na usp irá paralisar tudo, as salas, o clube de esportes, tudo o que puderem, mas mesmo assim eu não tinha planos de ir para lá, pois me dei um dia de folga, para fazer coisas que eu não deveria fazer, ir a lugares que eu não deveria ir. tenho treinado forte desde domingo e sinto dores do meu pescoço até meus pés. é tão difícil a “volta” ao treino de atletismo, o progresso dia após dia está acontecendo, mas é tão lento... já consigo fazer bons educativos de salto, consigo fazer bons exercícios de finalização de salto, na segunda-feira também fiz meu primeiro treino com sapatilha após a cirurgia, mas... o meu salto real ainda não está rolando. também vi que você ficou observando meu treino por vinte minutos, só para poder me julgar, depois você passa por mim e comenta “ele faz uma pose de quem sabe saltar...”. bem, você não pode apenas fingir que não existo? mesmo se eu ficar bom o bastante para ganhar de você em uma competição, eu ainda assim não estarei lhe subtraindo nada. aliás, você tem absoluta certeza de que nunca vou te vencer em uma competição, pois você e seu amigo acham que sou um lixo, e sei disso porque ouvi vocês dizendo.

vou ficar em casa no sábado, vou sim (mentira). eu deveria ir assistir a primeira etapa da copa usp de atletismo. assistir porque eu gosto de atletismo, porque eu quero ver o garoto bonito que eu gostaria de sair com, pois ele estará competindo; ver meus poucos colegas da fflch, mas esse é o problema. todos os dias alguém no grupo começa a me ignorar sem motivos. há um garoto no grupo que já estudou psicologia, eu gosto dele, ele é bem legal e ele me disse com bastante cuidado que eu sou louco e que “há coisas que não devemos dizer, só pensar”. mas eu não sou. e também lembrei hoje de colocar as cartelas de lítio e fluoxetina na mochila para tomar durante o dia porque a vida tem sido muito difícil para mim, não quero entrar no mérito do suicídio, mas a vida tem sido difícil para mim. é o que vou dizer para o último psiquiatra do meu plano de saúde que ainda não visitei. mesmo assim já voltei a tomar os remédios, pois é sempre isso que os médicos me mandam fazer, não importa como eu esteja parecendo, não importa o que eu diga: tomar lítio e fluoxetina.

Alguém ganha bochechas e alguém perde bochechas:

eu disse no facebook que não me importo com o que acontece nessa droga deste país mas. é claro que foi apenas um rompante. ainda é difícil ir trabalhar todos os dias na multinacional. parece que todos os funcionários são de direita e eles começam a falar sobre política após o almoço. ainda não é um tom de “dilma vadia”, mas é quase isso. eu me sinto acuado. eles sabem que eu faço fflch, e eles sabem que muitos ou todos na fflch são de esquerda e. fico só ouvindo eles conversando, conversando alto, me sinto acuado. a nossa “democracia” começou em 1989 e já temos dois presidentes derrubados por impeachment. isso diz muito sobre o tipo de povo que somos. uma gente ladra, ignorante e injusta; não importa quem caia, não importa quem suba. dilma perdeu as bochechas durante todo este processo. talvez também por acordar tão cedo para andar de bicicleta, talvez porque ela também é um ser humano que merece respeito (...)
já eu, ganhei bochechas por causa da síndrome de cushing, que desenvolvi por causa dos corticóides que tomei após a minha cirurgia no joelho  em dezembro do ano passado. a mudança na dieta, o treino, ajudaram o meu organismo a eliminar o excedente de cortisol mais rápido. hoje estamos em abril, essa é a primeira imagem que publico (sem as bochechas) após o episódio do cushing:


  

XOXO