“Stroopwafels”
Hugo Guimarães
Onze de julho, terça.
Hey estou aqui. No horário. Primeiro dia no emprego novo. Escritório
muito bem decorado. Miscreation I still love ya.
Decidi morrer durante o almoço mas. Mama passou por uma biopsia no seio
e terá problemas para organizar o velório, então decidi esperar mais alguns
dias.
Eu ia para a casa dela pegar meus remédios para a bipolaridade que
esqueci lá, mas desisti; por problemas de locomoção e por indisposição causada
por desordem mental.
Meu pai veio até a estação de metrô perto de casa e trouxe os remédios,
uma bela atitude.
Ao invés do suicídio eu decidi fazer um corte de cabelo novo para
parecer mais bonitinho.
O espelho me mostra que perdi minha beleza rápido demais se eu olhar
três anos para trás.
“Nada, só estou olhando sua beleza” Miscreation disse três meses atrás
no quarto dele quando me levantei, olhei para ele e disse “que foi?”
Talvez meu cérebro doente seja quem está sugando minha beleza; minha
intensa tristeza.
Minha gata não tem tido problemas para se acostumar com a casa. Eu sim. Chorei
duas noites seguidas. Em silêncio.
Não consegui ir treinar nem ligar o computador. Apenas deitei cansado
pelo trabalho e pela tristeza, pela falta da juventude e pela falta dele.
Ontem de noite pensei em publicar na rede social a frase “Tenho um amigo
novo e o nome dele é ~daydream nation do sonic youth~”, mas é melhor parar,
parar de mostrar tanta tristeza.
Dei uma curtida em uma bobeira que ele postou na rede social porque ele
curtiu a minha mais recente criação literária no meu blog.
O garoto sexy ao extremo que mora no quanto em frente ao seu jamais vai
te foder, não importa o quão doce você se mostrar mas, na verdade: eu nem me
importo.
Doze de julho, quarta.
É bobo perguntar a ele se devo ou não devo fazer. É bobo pergunta
qualquer coisa agora.
É melhor aguentar. “Aguenta” – assim como um garoto dominador entra em
uma relação sexual em uma casa de orgia para conduzir a cena. Apenas aguente.
É importante o que você está fazendo. As pessoas vão dar crédito para a
sua personalidade quando você o fizer. Veja o que aconteceu a Kurt Cobain.
Claro que não estarei aqui para ver o crédito, mas o fator é que isso não é um
fator. O fato, o fascinante fato é que estou fazendo as malas para uma viagem
incrível: morte.
É mais inteligente do que esperar pela sua morte para eu me sentir
melhor, ou matar você.
Mas quando eu me decidir sobre isso, eu penso em fazê-lo depois do
trabalho, depois de descansar meu corpo em uma cama, onde meu corpo inteiro
chora menos os olhos.
Logo, penso que não desejo morrer, desejo apenas descansar e descansar
para sempre se não posso ter você.
Depois de comer alguns biscoitos eu disse “pare”. Cale a droga da sua
boca. Não diga mais nada sobre ele. Deve passar. Deve.
Apenas publique algo depois que passar, quando você estiver hábil a não
falar sobre ele.
Tudo sob controle aqui. Cheguei na hora pelo segundo dia consecutivo em
meu novo trabalho; ás oito, bichas!
Um corte de cabelo ou lançar dardo?
Lançar dardo ou um corte de cabelo?
Ainda decidindo sobre o que vou fazer de noite.
Treze de julho, quinta.
Se a morte é uma viagem, a vida também é uma cheia de sensações.
A vida seria muito chata se você tivesse tudo o que quer.
As sensações da viagem da morte são até então desconhecidas.
gotta devil's haircut in my mind
gotta devil's haircut in my mind
yeah
eu não quis apenas comentar sobre o que eu fiz na noite passada ao
cantar o refrão de “devil’s haircut” do Beck, do álbum “Odelay” de 1996. Quis
dizer que eu faria o mesmo se fosse ele. “Odelay” é um disco alegre e muito
louco, enquanto todos estavam esperando que o Beck fizesse um álbum triste e
introspectivo naquele momento porque um monte de gente perto dele tinha
morrido. Daí ele apareceu com o “Odelay”.
Com o meu corte de cabelo diabólico, tirei uma nova foto de perfil para
o facebook. Uma foto de escritor, não uma foto de body builder como as que tenho tirado há tempos. Quatro dias de
descanso não me causam nenhum medo sobre voltar a treinar fora de forma, ao
contrário – me causaram uma sensação de renovação do meu pé direito que estava
doendo muito.
Mesmo com gripe, eu quero dizer que a vida não é pior sem você, babe.
Emergi um pouco diferente nessa manhã. É, cheguei aqui ás 7:47 da manhã. A
gripe vai desaparecer amanhã, quando eu completar dois dias de treino duro e
uma semana no meu emprego novo e na minha casa nova. Daí eu vou beber uma Faxe
azul como eu costumava fazer em todas as sextas-feiras. Não beber muito, só uma
Faxe azul para celebrar a noite da sexta-feira. Talvez algum sexo talvez não,
mas eu sei que isso não é lá importante desde que eu tentei trazer de volta a
vida um assunto que nem mesmo quero falar: amor.
Quatorze de julho, sexta.
Aqui no horário de novo, bichas. Pela quarta vez seguida. Em uma cidade
que chamam de Los Angeles brasileira (estou falando de Alphaville), mas se você
não mora aqui, só trabalha por aqui e não tem acesso aos chiques condomínios
fechados, ela não passa de algo como o centro de Jakarta. Aqui e de mostarda,
bichas. Sei que todos que veem essa camisa que visto hoje, veem a cor laranja,
ok mas. Só quero dizer que é um puta bom gosto essa camisa.
Ontem de noite voltei ao treino de dardo depois dos quatro dias de
descanso para o meu pé e para o meu cérebro. Bem, não foi fácil sair de lá com
lançamento de 36,60m para a minha
história. Ontem de noite fui Greta Garbo e não liguei para apps ou chuveiros de
vestiários, só queria ir para casa dormir para chegar no horário no escritório
no dia seguinte, como de fato fiz.
Eu chego na pista e todos a deixam. Os físicos, os arquitetos e os
médicos. Todos vão embora quando eu chego. Sei que eles foram embora apenas
porque era a hora deles de ir embora, mas é uma alegoria que me traz uma imagem
de sofrimento, entende? Disse a mim mesmo “isso é sofrimento, bebê – aguenta”.
Eu apenas quis ficar só porque não adianta sofrer porque ele não me
quer, não vai me trazê-lo de volta sofrer. Sei que não é minha culpa me
apaixonar, mas eu também sei esse amor está ficando fraco todo dia mesmo que eu
ainda pense muito nele.
A filosofia da noite foi: um homem não precisa ser didático para lhe dizer
que não te quer. O silêncio basta e você sabe disso, mesmo porque você mesmo o
fez muitas vezes. Foi o que Miscreation fez, disse com silêncio o que eu queria
que fosse dito de outra forma, mas no final a resposta é a mesma, ele não me
quer. Por curiosidade e um pouco de ócio na tarde passada, eu estava checando
e-mails velhos que eu escrevia para o Harry Pottter do parque dom Pedro,
dizendo que eu o amava que precisava dele. O quanto eu queria aquele
sanguessuga vulgar e o quanto eu me sinto tolo por ter escrito aqueles e-mails
meses depois e vou me sentir assim também daqui a alguns meses sobre o que
escrevi para o Miscreation. Mas o mundo também dá suas voltas e o mundo é um
filho da puta. Eu lembro de um certo lituano que me apaixonei aos dezoito e que
me descartou como lixo. Quatro anos depois eu o encontrei pelo destino, ele com
dez quilos a mais e dez mil fios de cabelo a menos e daí foi a minha vez de
usa-lo, cavalguei sobre ele duas vezes e o descartei. Também me lembro de um
cabeleireiro de Moema, que também me apaixonei por anos atrás, e o encanto
acabou quando eu o levei para a casa dos meus pais: o desencanto da zona leste.
Hoje, agora que eu pareço um homem, tenho jeito de homem, agora que estou
gostoso e tenho o corpo todo musculoso, ele vem me incomodar em apps fingindo
que não se lembra do que aconteceu no passado, mas eu lembro e é a minha vez de
ignorá-lo. Essa é a vida, bebê.
Adaptação na realidade:
Ao invés da camisa mostarda, eu declinei para a minha camisa azul de
manga longa mais quente que tenho, e ainda uma camiseta debaixo dela, e meu
casaco mais quente por cima disso tudo porque passei boa parte da noite
tossindo muito por causa do frio e da gripe que piorou depois do treino outdoor
de ontem á noite sem roupa térmica. Hoje tenho planos de declinar do treino de
salto triplo e substituir por um treino de musculação dentro de uma academia
bem quentinha. Daí sim eu vou para casa beber minha Faxe azul e não pegar uma
pneumonia. Amanhã, debaixo do sol de sábado, sei como juntar dois treinos de
salto triplo em um, como já fiz outras vezes e penso que é a melhor forma de
ajustar o treino devido ao clima muito frio.
Quinze de Julho, sábado.
Não foi apenas uma Faxe ontem á noite.
Primeiro pensei que sexo fosse uma necessidade fisiológica e daí eu
passei a questionar se realmente é.
Aconteceu um pequeno desastre, uma pequena devastação.
Não fui treinar ontem e não vou hoje.
Isso é sofrimento, bebê. Aguenta.
Vou ao cinema de noite, mas não vou matar minha mãe antes.
Brincadeira.
Preciso fazer coisas assim, como ir ao cinema.
Vou treinar amanhã e depois dessa desastrosa semana de treinamento,
ficarei feliz se eu conseguir aterrissar na caixa de areia fazendo um salto
triplo da tábua de onze metros.
Dezesseis de julho, domingo.
Fiz. Vi dois filmes no cinema e comi dois hambúrgueres do mcdonald’s.
Preciso ser feliz, preciso ficar feliz, gente. É muita má energia para a minha
gata absorver, coitadinha.
Ok, dormi demais e não consegui ir á USP fazer a série C do treino de
salto triplo ou ir á academia, mas é ok dormir, e passar mais tempo na cama com
a minha adorável gata e. Como um gato eu posso sempre improvisar: vou ao
Ibirapuera de noite fazer a série E de salto triplo (para a qual não é
necessária uma caixa de areia) e posso aproveitar e fazer exercícios para as
minhas costas, os bíceps e os tríceps usando aqueles aparelhos públicos que tem
no parque. Vai ficar tudo ok.
Pensei em desistir por um momento, mas não vou desistir das minhas
stroopwafels.
Liguei para a minha mãe e ela está bem, ela passou por uma biopsia em um
dos seios, mas se recupera bem, vai até voltar a trabalhar semana que vem.
O proAC abriu editais para criação literária essa semana. Fiquei tão
feliz, pensei que não abririam esse ano por causa da crise ou algo, mas
abriram. Mais dinheiro (vinte e cinco mil reais contra os dez mil de 2015,
quando ganhei), mas mais dificuldade dessa vez: das dez bolsas oferecidas, eu
só posso concorrer a duas (para autores não estreantes domiciliados na
capital), mas eu acredito, acredito muito no meu querido “Drag por drag” e vou
começar a fazer meu projeto antes de ir ao supermercado comprar meias novas,
antes de ir ao parque treinar.
Dezessete de julho, segunda.
Bem, também não fui ao parque ontem. Para me recuperar da gripe, da
tosse. Estava frio e tudo virou desculpa para a minha preguiça. Passei o dia
trabalhando no projeto para o proAC. Bem, estou aqui na Jakarta brasileira,
cheguei cinco minutos atrasado e isso não soa bem. Recebi uma convocação de
entrevista por e-mail e estou começando a achar que não ganho o suficiente para
levar duas horas para ir e duas horas para voltar do trabalho. Vou voltar a
mandar currículos para novas vagas.
Terei em mente que estive sem treinar por uma semana porque estive
doente e porque eu tinha uma dor no meu pé direito, e que vou voltar essa
segunda-feira e treinarei até sexta-feira todos os dias e assim terei uma boa
competição no domingo.
Bem, acho que Miscreation é apenas alguém que só pensa em comida e que
ele está saindo com um cara bem mais másculo que eu, mais alto e mais forte
também. Então eu estava apenas perdendo meu tempo de fato. Não sei se sustentar
uma paixão platônica pelo meu novo vizinho é bom ou não, mas é certamente
melhor que um pé na bunda. Aliás, um amor platônico me afasta melhor de outros
caras. Assim, quando eu pensar eu convidar um homem para “estrear” meu novo
quarto, eu vou pensar no sorriso perfeito do vizinho novo e declinar. Acho
melhor gozar com a minha mão no xvideos e continuar sonhando com aquele
sorriso, aquela doçura e o quanto ele é lindo de pijamas.
Dezoito de julho, terça.
Mesmo em más condições eu consegui lançar o dardo a 36,53m na noite passada, sem problemas. Acho que posso ultrapassar
a barreira dos trinta e sete metros na competição treino de domingo.
Quando estou tomando banho no vestiário do cepeusp, não sei se meus
olhos estão molhados por causa do chuveiro ou se a água está vindo de dentro
dos meus olhos.
Quando você estende uma toalha para secar as costas, parece que você
está carregando uma bandeira depois de ganhar uma medalha para o país.
Fui á uma feira comercial ontem. Bruno, o gatinho Bruno me deu uma
carona até a pista depois da feira e aquilo me disse que eu deveria ir treinar
ao invés de ir para casa, eram os planos que eu tinha durante a feira.
Ao atravessar a ponto da cidade universitária eu encontrei o veterinário
wannabe gatinho, meio alemão meio japonês, ele me deu dois beijos na bochecha,
que doce...
Eu ainda sinto aquele vazio, sozinho na pista, como se eu estivesse
esperando alguém me passar uma mensagem por celular, mesmo eu sabendo que
ninguém iria. Depois fui pra casa sentindo culpa por “fazer o que estou
fazendo”. Não estou praticando assassinato, tortura, auto tortura, roubo,
perseguição nem nada disso. Eu estou indo a trabalhar de manhã e indo a treinar
de noite, é o que estou fazendo.
Em casa eu estava tão cansado do treino. Mesmo assim assisti 1:25 horas
do Melancholia do Lav Diaz e fiz uma
boa parte do meu projeto para o proAC, mas acho que só vou conseguir retomar
essas duas atividades no domingo, por estar cansado demais durante a semana.
Dezenove de julho, quarta.
O dia mais frio do ano nessa cidade me impediu de ir ao treino ontem,
mas ok. Eu tinha uma folga programada para quinta-feira e apenas a tirei antes.
O livro deve morrer assim como o homem deve morrer. O livro é bom, o
crime é lindo, mas a motivação é tão fútil, então é melhor deixar o livro
desaparecer dentro do blog.
Meu crush platônico chegou em casa ontem com uma garota, garota, garota.
Eu deveria saber – ele é hétero e se é gay, me odeia.
Comprei sabão em pó, lavei roupa, mas não comprei meias, mas irei.
Tirei a noite para continuar meu projeto para o proAC, e acho que estou
fazendo bem.
“Hello Johnny boy”, assim começa “Shatter”. Terminei o dia ouvindo a versão demo da
canção “Shatter” da Liz Phair, a qual eu passei o dia anterior tentando
entender o significado do título.
A canção diz “But something about just being with
you/ Slapped me right in the face, nearly broke me in two”.
Hello Johnny boy, bye Johnny boy, apaguei a cara dele da minha rede social
e dessa vez para sempre. Eu não quero que ele me veja morrer e eu não quero
mais ficar vendo sua extrema felicidade.
Os canais do tempo mentem. Três graus a menos do que eles previram é o
que temos, e daí esta noite talvez faça nove ou dez graus, mas eu vou treinar
mesmo morto!
Vinte de julho, quinta.
Hoje eu quero falar de fé, bondade e sorte;
Após o meu treino de ontem á noite, eu disse a mim mesmo “se eu
acreditasse em um deus, eu colocaria uma moeda em seu altar essa noite”, por eu
ter conseguido fazer um treino de salto triplo muito bom depois de doze dias
sem saltar por causa da dor no pé. Saí da pista com um salto de 11,59m acreditando ser possível fazer
um salto de doze metros na competição de domingo.
Quando eu estava na esquina de casa, porém: sofri uma tentativa de
assalto. Reagi a despeito de que sei que não é a coisa certa a se fazer. Um
carro parou do meu lado e um homem desceu e me atacou, agarrou meu braço, mas
eu reagi, gritei com ele, soltei meu braço e corri o mais rápido que pude com
meus sapatos sociais muito desconfortáveis. Quando cheguei em casa, meu joelho
direito estava inchado e meu joelho esquerdo doía muito.
Não consegui acordar para ir trabalhar hoje. Perdi a hora de acordar e
nem me importei. Apenas não pude ir, fiquei na cama. Quando acordei, fui checar
minha conta bancária, fui ao KFC e comi seis dos oito pedaços de frango que
comprei. Ao invés de jogar os dois que sobraram no lixo como sempre faço, pedi
para viagem e dei a uma mendiga na rua.
Comprei três pares de meias.
Quando voltei para casa, alemães me ligaram me convidando para um
processo seletivo de um novo emprego. Fui lá fazer testes de idiomas e uma
entrevista no RH da agência de empregos e se eles gostarem de mim, vão me
mandar conversar direto com os alemães na semana que vem. O salário é bem mais
alto do que o que eu tenho agora, o endereço deles é bem mais perto da minha casa.
Vinte e um de julho, sexta.
Aqui estou, queridos. No meu trabalho que me paga uma merda para não
fazer nada o dia inteiro. Hoje registrei meu recorde de atraso: onze minutos.
Não gosto de vir para a little Jakarta todos os dias, na verdade odeio esse
lugar. Prefiro ir ao Morumbi todos os dias, onde os alemães estão. Esperando
ansiosamente por uma resposta da agência de empregos sobre os testes que fiz e
uma data para eu ir falar com eles semana que vem. Não vou mentir por aqui, vou
apenas dizer que “preciso me ausentar por um período para resolver um problema
pessoal” e isso é honesto, mais do que dizer que vou ao médico. Comi menos que
400 gramas no almoço hoje e é um bom começo de dieta. Também comi seis doces ao
invés dos oito que costumo comer e é também um bom começo. Hoje á noite eu
quero 11,80m da tábua de nove metros. E eu quero lançar o dardo o mais longe
possível em quatro tentativas. Daí eu vou voltar para casa para checar se minha
vitrola realmente voltou á vida (houve um problema elétrico em casa ontem). Ao
invés do “Saló” da sexta-feira passada, eu provavelmente vou comprar duas Heinekens, trabalhar no meu projeto do
proAC e terminar o dia assistindo mais um pedaço do Melancholia do Lav Diaz.
Vinte e dois de julho, sábado.
Bem, garotos: acordei ás cinco da tarde devido a uma tristeza incomum
por causa da minha vitrola que não funciona, por eu pensar que estou preso em
um quarto sem música, por eu ter bebido quatro cervejas ao invés de duas e por
eu ter tido estranhos pesadelos onde eu perdia a minha gata. Também tenho uma
pequena dor no meu joelho direito por eu ter conseguido o que eu queria na
noite passada. Sim, a pista estava vazia porque estava frio e era noite de
sexta-feira e todos os garotos e garotas tinham um lugar para ir ou alguém para
encontrar e eu estava lá sozinho. Mas um salto de 11,84m me fez tão feliz que aceitei a solidão. Quero muito saltar
tanto quanto e ultrapassar a barreira dos doze metros amanhã na competição, por
isso que estou quietinho em casa com gelo no joelho ao invés de ir ao cinema.
Toda a música que consigo ouvir vem do meu telefone e eu sempre toco as músicas
do “Girly-sound” da Liz Phair e “Fuck and run” é ainda mais triste que
“Shatter”, que eu sempre ouço enquanto coloco gelo no joelho. Pensei em mandar
a música para o Miscreation, mas desisti bem logo porque seria muito ridículo.
Vou passar o resto do dia descansando, comendo chocolate, trabalhando no projeto
e é bom, bom passar o dia todo sozinho, sem olhar para a cara de ninguém.
Vinte e três de julho, domingo.
Na cama, vagando sobre o fato de eu nunca ter conseguido atingir meu
único objetivo na vida, que é amar e ser amado por um homem: eu não acredito
que vai acontecer mais, agora que já tenho trinta e dois; penso que a vida já
se encerrou e o que eu tenho passado é algo como “pós-vida” e foi difícil
dormir na noite passada.
Bem, acordei ás seis da manhã e fui fazer o que eu tinha que fazer.
Bem, um salto triplo de apenas 11,65m
não era o que eu esperava, mas não foi lá tão ruim. Eu consegui acertar um dos
quatro saltos que tive direito. Os ventos estavam fortes e inconstantes, o que
arruína uma prova de salto horizontal. A despeito disso, pude melhorar minha
marca em dezenove centímetros comparando com a etapa de abril dessa mesma
competição, enquanto o melhor saltador da prova saltou trinta centímetros a
menos dessa vez. Ou seja, eu consegui lidar melhor com as más condições do que
um atleta melhor que eu ;)
No lançamento do dardo tive uma grata surpresa. Eu estava esperando
lançar além de trinta e seis metros e se conseguisse, já sairia feliz da pista,
mas então eu fiz um excelente lançamento de 37,98m, a segunda melhor marca da minha vida.
Bem, acho que estou pronto para pegar minhas stroopwafels daqui a três
semanas.
Vinte e quatro de julho, segunda.
Bem, o fato de chegar á little Jakarta ás onze da manhã explica o que
aconteceu quando minha amável vizinha me convidou para me juntar a outros
roomates para tomar uma cerveja no quintal. É bom socializar, mas também é bom
exercitar a habilidade de dizer “não” quando você tem de dizer não. Estou
tentando parar com o álcool e estou um tanto quebrado.
O ônibus extremamente lento que me traz até a little Jakarta, me trouxe
em uma hora e meia saindo do metrô Paraíso. Vim pensando, triste, que eu não
gosto daquela casa, não gosto desse emprego, que sinto falta da outra casa que
eu vivia, da varanda que eu tinha, minha gata gostava tanto da varanda e eu já
mandei mensagem ao dono das casas que quero voltar para lá caso o inquilino que
está lá agora vá embora por algum motivo. Não tenho ainda resposta dos alemães
e são 11:50 da manhã agora. Ninguém dá a mínima sobre a minha competência de
lançar um dardo a trinta e oito metros de distância. Ninguém do pessoal do
atletismo curtiu meu post no facebook sobre o meu feito. Nenhum atleta e nenhum
técnico. É a melhor marca da minha vida em competições e ela me faz o sexto
melhor lançador de dardo da USP (incluindo as unidades da USP no interior do
estado) e ninguém está nem aí, nem me estende a mão por isso. Vinte pessoas das
artes e contatos diversos curtiram o post sobre a competição.
O proAC foi rápido e eles me mandaram um e-mail com meu login e senha
para eu submeter o meu projeto.
Vinte e cinco de julho, terça.
Aqui de novo, cedo. Apenas dezesseis minutos de atraso ao invés de três
horas. Mas ainda assim não gosto de atrasar nenhum minuto. Cheguei em casa
ontem extremamente triste, mas finalmente em casa, subindo a escada dizendo a
mim mesmo “eu ainda tenho essa casa que não gosto, eu ainda tenho esse emprego
que não gosto”. Entrando no quarto, vi que minha vitrola funcionava, o
locatário resolveu o problema elétrico e poder colocar um CD da Tori Amos para
tocar me fez bem mais calmo enquanto eu comia meu jantar que custou cinco
reais. Ao falar em dinheiro, achei dinheiro dentro de um DVD, tinha esquecido
que deixei lá. Sorte, agora tenho dinheiro para passar a semana decentemente.
Fiz minha inscrição para o proAC sem nenhum problema e tive um bom sono. Hoje
de noite vou voltar a treinar. Eu tenho dor nos meus dois joelhos depois do
esforço do salto triplo de domingo (a dor piorou depois do esforço daquele
salto de 11,65m em que usei muita força, com medo de não alcançar a caixa de
areia e tive que saltar da tábua de onze metros porque não fizeram tábua de
nove). Cogitei em deixar de fazer o salto triplo definitivamente e focar apenas
no dardo, mas agora que falta tão pouco para as minhas duas competições
importantes de agosto, que acho que vale a pena lutar contra a dor e ter o meu
lugar na convocação da Laausp do ano que vem na prova do salto triplo, eu trabalhei
por isso e mereço.
Vinte e seis de julho, quarta.
"So fire up the batmobile / cuz I gotta get outta here";
"another day for me and you/ another day with nothing to do". 07:58 e
cá estou para fazer uma marca azul no meu pré histórico cartão de ponto. Agora
é só esperar passar as nove horas de inércia até eu ir para a USP fazer um belo
treino.
Devo dizer que fui para casa ontem de noite. Andei por cinquenta e dois
minutos para economizar o dinheiro do ônibus. Aconteceu que fiquei tão cansado
que acabei desistindo de ir treinar, somando ainda o fato de que eu esqueci-me
de colocar uma toalha na mochila. Nada disso importa. O que importa é que vim
pensando na morte durante a viagem de trem. A amiga morte como menciono no meu
romance inédito “Drag por drag”. A morte me consumirá, minha frágil vida pode
ser tirada de mim em um assalto; a morte vai consumir você, Miscreation – você
e a sua exuberante face, e o fato de você ter recusado passar mais tempo
comigo, será apenas experiência já que a vida é apenas uma experiência,
contudo, ao que eu me sinto como um espião ou um correspondente de outro
planeta ou de outra dimensão, que estou aqui só experimentando, só observando.
Estive pensando que a morte irá reduzir a sua exuberante face ao pó e isso é
irreversível. Em casa, estive pensando nos motivos fálicos da Tori Amos: “Se eu
morrer hoje, serei um fantasma feliz, vou á opera sem precisar pagar”.
Vinte e sete de julho, quinta.
Perdão por escrever um pouco tarde. São 6:45 da tarde e estou feliz em
casa ouvindo o “Exile on guyville” da Liz Phair com uma caneca de café na minha
mesa, visitando um site para procurar um quarto novo para alugar. Não,eu não
fui á little Jakarta hoje porque os alemães me ligaram, sim. Estive lá ás duas
da tarde e ás cinco da tarde me ligaram de novo para dizer que fui aprovado na
dinâmica de grupo. Amanhã, terei a entrevista final com o gestor da área. Dedos
cruzados. Disse á little Jakarta que eu estava doente e aproveitei a manhã para
ir lavar meus ouvidos no hospital, eles estavam bem sujos; fui também para
conseguir um atestado médico para abonar a falta, claro. Meu roomate feioso
reclamou da minha gata, que fica miando do lado da janela dele e essa é só uma
das razões que me fazem odiar essa casa. Também não fui treinar hoje porque
estou com um pequeno resfriado do treino de ontem. O resfriado, o desconforto e
o frio, me permitiram fazer um lançamento de dardo de 36,84m ontem de noite, o que não foi ruim considerando as más
condições. Vou passar o resto do dia de hoje quietinho em casa, tomando
antigripais, procurando um quarto novo para alugar e descansando.
Vinte e nove de julho, sábado.
Não consegui escrever ontem. Eu estava muito melancólico. Estive ontem
na minha entrevista com os gestores alemães para o trabalho que quero tanto e
não sei se eles gostaram de mim ou não. Eles tinham mais duas entrevistas para
fazer depois da minha e no final do dia, eu não recebi a mágica ligação da
garota da agência de empregos dizendo que fui contratado. Sei que a resposta só
virá na semana que vem, pois eles teriam pouco tempo para tomar a decisão ainda
ontem, mas ainda assim fiquei triste e com medo. Não consegui ir treinar porque
entrevistas de trabalho me afetam muito a um ponto em que não consigo fazer
mais nada depois de uma. Fiquei em casa ouvindo o Led Zepellin, tomei duas
cervejas.
Estou feliz por não precisar de sexo hoje. Eu poderia ter ligado para o
louro gato pra caralho que conheci no app e ir até a casa dele como planejado
ontem, mas eu não liguei para ele e ele também não me ligou, e quer saber? Não
faz a menor diferença para mim.
Mesmo tendo uma terrível semana para o meu treinamento, eu vou descer
para a USP em alguns minutos para fazer um treino de salto triplo e daí irei
para a casa dos meus pais para pegar alguns objetos que esqueci lá, e para
comer.
Trinta e um de julho, segunda.
vide "VOCÊ NA
TERRA".
Primeiro de agosto, terça.
Algumas coisas
acontecem comigo que me deixam envergonhado. Eu faço coisas que me deixam com
vergonha de mim mesmo, que eu não digo para mim mesmo, então não faz sentido
dizer para um diário.
Tudo o que eu tenho a
dizer é que é noite agora. Trabalhei em um livro de contos muito velho, que
comecei a escrever lá em 2011 e esse livro tem a comédia diretamente ligada á
loucura como nenhuma outra coisa que eu já tenha escrito. A comédia está presente
no post mais recente do meu blog. Talvez eu só precise rir um pouco. Rir.
Dois de agosto, quarta.
Minha idade de trinta e três parece mágica, a idade perfeita para me
despedir. Eu sinto que houve grandes campos, oceanos e depressões como a
Holanda na minha vida; e então eu entrei por um lindo labirinto e no final dele
tinha um cubo mágico e, lá dentro eu tive o que procurei pela minha vida
inteira. Agora, não há nada mais a fazer, nada mais para ver, nada mais para
acontecer.
Três de
agosto, quinta.
É melhor ficar sem você e deitar na
cama ou ficar sem você e deitar na lama? (isso ainda depende dos alemães que
ainda não me contrataram)/ voltei para casa de noite filosofando/ minha vida
não deu certo, eu só estou a sustentando porque eu devo gratidão à minha beleza?
Minha beleza vai acabar vai virar pó cedo ou tarde/ treinei dardo duas vezes
essa semana/ conto quatro sessões de treino até agora/ eu estava certo em parar
de treinar ontem, consegui me arrastar até o fim do treino, mas não consegui me
arrastar para o primeiro dia de aula/ hoje acordei e fiquei dançando no quarto
ouvindo Rita Lee, feliz/ ando instável/ estou na sala de espera da minha
primeira sessão de terapia/ fui convidado para treinar com a seleção de
atletismo da USP pela primeira vez, mesmo com a minha ardilosa
"suspensão" da atlética da FFLCH/ garoto me quer, garoto me quer não/
ao invés de ver tanta rejeição, achei melhor treinar de manhã, quando não tem
ninguém, garoto nenhum/ acho que consegui um técnico, devo começar na
sexta-feira que vem/ saberei sábado se poderei ter a honra de vestir a regata
da Laausp pela primeira vez na terceira etapa do campeonato paulista universitário
de atletismo no dia doze/ "decidimos desligar você, Hugo" ele disse e
eu: "ah é? O que vão fazer? Me tirar da tomada? Sua bichona velha
enrustida. Nothing even
matters - to me”.
Quatro de agosto, sexta.
“My
new book is not a drag” hehe. Felicíssimo é pouco para expressar o
que sinto por meu romance inédito “Drag por drag” ser eleito um dos finalistas
do prêmio “Programa nascente 2017” da USP, os finalistas foram divulgados
ontem: http://prceu.usp.br/nascente/finalistas-de-texto/ ; é o
primeiro “selo de qualidade” do meu livro, o primeiro passo para a sua
publicação, que desejo tanto/ conversando hoje de manhã brevemente com uma
roomate, ela deu um exemplo da prova dos 3.000 metros com obstáculos, dizendo
que obstáculos foram feitos para serem superados, pois são obstáculos, não são
impedimentos. Serviu para começar bem o dia. Os obstáculos de hoje são: superar
uma obsessão por um homem, conseguir competir na terceira etapa do campeonato
paulista de atletismo no próximo dia doze (seja pela FFLCH, seja pela seleção
da LAAUSP, seja de forma avulsa), manter a esperança de ser contratado pelos
alemães, manter o treinamento de atletismo, ir á minha primeira aula de literatura
brasileira VI e sobreviver.
(Sobreviver é a parte da corrida em que
eu caio no fosso d’água)
Adendo á morte:
Hoje saindo do Santander para pagar a
minha taxa de anuidade para a FUPE, vi uma pomba sendo esmagada por um ônibus
na minha frente. Três pombas estavam tentando bicar algo no meio do asfalto,
daí veio um desses ônibus silenciosos gigantescos. Eles são tão silenciosos que
nem as pombas perceberam a chegada dele e, quando viram já estavam debaixo do
ônibus; duas conseguiram escapar, uma acabou esmagada. Na faixa de pedestres
pensei “são ratos voadores, mas coitadinha... Não tem culpa; mas não deve ter
sofrido, foi tão rápido...”. Ao acabar de atravessar a faixa, pensei que podia
ter sido comigo, que eu poderia ter sigo esmagado por um ônibus silencioso
gigante em um segundo e pronto: não haveria mais tuna, não haveria mais fupe,
não haveria mais paulista máster, não haveria mais briga com a atlética, não
haveria mais Miscreation, não haveria mais produção literária, não haveria mais
nada. Por isso que eu tenho que andar por aquela rua arborizada do lado da raia
olímpica o máximo que eu puder, fazer o salto triplo e aterrissar naquela caixa
de areia o máximo que eu puder, lançar dardos naquele gramado o máximo que eu
puder, escrever o máximo que eu puder, superar decepções amorosas o máximo que
eu puder, acreditar no amor o máximo que eu puder.
Cinco de agosto, sábado.
Minha sexualidade é um atraso. A
homossexualidade masculina é inconstante, é inconfiável. É daí que nasce a
minha frustração; pensei nisso hoje enquanto lançava dardos e lançava bem. Saí
de lá com um melhor de 37,75m com
uma leve queima, ultrapassei brevemente a linha branca, mas foi só em um dois
oito lançamentos que fiz, estou preparado para a FUPE. Ele não é o que eu quero
e eu não sou o que ele quer. Assim ficaram as coisas quando eu disse o que
disse e ele não me deu outra chance. Poderíamos nos dar muito bem, eu poderia
ser o que ele quer e ele poderia ser o que eu quero, mas não houve tempo. Assim
como não houve tempo para o Jeff Buckley terminar sua joia de segundo álbum,
morreu afogado no Mississipi antes.
O que seria meu primeiro treino com a
seleção de atletismo da USP resultou em um cancelamento, mas via whatsapp o
treinador me convocou para defender a USP na terceira etapa do campeonato
paulista de atletismo que acontecerá no próximo sábado. Foi simples, não
precisei brigar com ninguém. É a segunda notícia boa da semana. Semana que vem
terei mais notícias boas, muitas. Ele falar comigo de novo, me ver de novo,
definitivamente não será uma delas. É como eu disse, ficaram equívocos, não
houve tempo de resolvê-los. E após fazer uma equação de quem anda o
acompanhando por aí e a rede de amigos em comum comigo que essa pessoa tem, não
é difícil fazer uma conclusão simples. Fracas, as relações homossexuais
masculinas são muito fracas e mentirosas. Se homens heterossexuais são
autênticos mentirosos, nós gays somos piores, muito piores.
Ontem eu fui á aula, eu me arrastei até
a aula de literatura brasileira VI. Acho que nunca noventa minutos passaram tão
depressa se tratando de uma aula de faculdade. Hoje fui ao sebo. Comprei seis
cd’s e dois dvd’s. estou tentado a ir á sauna, para chupar o máximo de homens
que eu conseguir, beber e cheirar cocaína, já que é inútil acreditar no amor.
Porém, amanhã eu tenho um treino de salto triplo importante para fazer. O que é
ótimo. Na maioria das vezes tenho de optar entre duas coisas que não quero
fazer, nesse momento é o contrário. Vou continuar ouvindo o rock
industrializado da Sheryl Crow aqui enquanto decido.
Seis de agosto, domingo.
Estou ok. Fui á sauna ontem. Fui
penetrado por um homem árabe razoavelmente dotado que tinha uma atitude
masculina bem louvável. Eu podia ter pegado o número dele. Não pequei porque
não quis. Não quero problema com homens. Consegui mais algumas brincadeirinhas,
gozei dentro da sauna. Fiquei um pouco na sauna para recuperar os músculos, já
que paguei para entrar na sauna. Bebi pouco e, por sorte o funcionário que
consegue cocaína pra mim lá dentro ficou me enrolando a ponto de eu perder a
paciência e vir embora pra casa em plena onze da noite. Bom. Assim eu
economizei o dinheiro da cocaína e o dinheiro do táxi. Mesmo assim eu perdi meu
treino de salto triplo de hoje. Acordei tarde. Eu poderia ter até tentado, mas
a linha amarela está fechada para obras hoje, os trens da CPTM também estão
operando menos e eu teria de ir de ônibus. Um treino de uma hora ou uma hora e
quinze seria pouco e achei melhor apenas postergar esse treino para amanhã.
Hoje, ou vou ao cinema ou vou para a casa da minha mãe pegar a minha sapatilha
com pregos nos calcanhares (para usar nas competições do próximo fim de
semana). Eu me sinto confortável para lançar dardos sem os pregos nos
calcanhares, mas um bom lançador de dardo deve usar pregos nos calcanhares,
portanto eu usarei. Estarei representando a USP, não é qualquer competição.
Sete de agosto, segunda.
Fui comprar café solúvel, cream cheese,
presunto e iogurte; a caixa do supermercado me disse “boa semana”. É exatamente
o que pretendo ter. Veja o planejamento da minha semana, inédito nesse blog:
8
|
FUPE III
|
Paulista Máster
|
||||||
17
|
TJC+B
|
GYMN (PC)
|
rest
|
TJA+B
|
rest
|
|||
19
|
(GYMN P/O)
|
JTA+B
|
GYMN (B/T/C)
|
|||||
21
|
LB VI
|
LBVI
|
||||||
07/ago
|
08/ago
|
09/ago
|
10/ago
|
11/ago
|
12/ago
|
13/ago
|
Se fosse combinado não daria certo. Fui
saltar na mesma hora que o Emílio, saltador máster de nível mundial. Com ele,
vieram o novo treinador da FFLCH, que o será por apenas dois meses até o Biffe.
Ou seja, depois vai acabar o atletismo na FFLCH de novo e a equipe vai ficar
sem treinar e competir até agosto de 2018. Aff. Com eles, também veio o técnico
da seleção da USP, que me dirigiu a palavra pela primeira vez em quarto anos
que frequento aquela pista. Fiz o treino com esses três experts apontando os
defeitos do meu salto triplo (que são inúmeros). Acabou que o máximo que
consegui fazer foi um salto de 11,91m.
Mas dá uma sensação estranha saber que eu faço tudo errado no salto triplo, que
tenho que praticamente aprender a saltar. E ainda assim, todo torto, eu
competirei sábado pela seleção em condições de pelo menos superar os doze
metros (o que me torna competitivo), com todos os problemas técnicos a
melhorar...
Oito de agosto, terça.
“Fight back, Julien!” lembro daquela cena do filme “Julien donkey-boy”
do Harmony Korine, cena em que o esquizofrênico Julien simula uma luta com o
irmão wrestler; a irmã, vivida por Chlöe Sevigny fica gritando durante a luta
“Fight back, Julien! Fight back, Julien!”. Fight back, Hugo.
Perguntei ao ninfetinho DM do atletismo da FFLCH, pela ultima vez, se
posso voltar a treinar com eles, aproveitando que eles contrataram um puta
técnico de salto. A resposta foi “não” e a minha réplica foi “ok, obrigado”.
Portanto, agora eu tenho mais um motivo e motivação na minha medíocre vida, que
é segredo até então, mas que saberei se terei sucesso no começo do próximo ano.
Isso, somado ao resultado do premio Paraná de literatura, que sai em dezembro,
me manterão vivo por pelo menos mais seis meses talvez.
1. posso prever você nervosa em um certo dia dizendo “você não disse que
só voltaria para cá morto?” e eu vou dizer de volta “já me sinto morto há muito
tempo”
2. não acredito que vou ter que lançar amanhã. Sim você vai lançar, vai
saltar, vai escrever, vai observar a vida passar. Passar como uma doença, a
doença passa.
3.
fale comigo, então
me salve desse inferno, irmão.
Nove de agosto, quarta.
Uma mulher grávida se suicida? Há relatos? Penso no meu livro inédito,
que quero vê-lo, beijá-lo. Não foi só a Sinead O’Connor que teve um dia difícil
ontem. Bebi, não fui fazer musculação, comi muito, estive muito nervoso
principalmente por esperar pela ligação dos alemães, e que esse trabalho vai me
salvar de voltar de novo para a casa da minha mãe. Sei que vão ligar, já
prometeram que vão, mas ontem foi um dia horrível. Desde ontem á noite estou
ouvindo o meu vinil do “The Lion and the cobra” da Sinead e eu nem tinha
prestado atenção, ou lembrado que o disco é tão bom. A inquietação me fez
passar uma mensagem ao Miscreation perguntado se nós podíamos voltar a
conversar. Ele disse “sim, claro” com sua doçura de sempre, mas não tenho nada
para conversar a não ser dizer para ele que quero ir para cama com ele de novo,
que quero olhar nos olhos dele de novo. Mais do que isso: eu escrevi isso para
ele hoje de manhã e bem provavelmente já arruinei essa nova “tentativa” ao
escrever isso. Criei uma conta no Sarahah e, nessa mesma manhã alguém me
escreve: “enquanto você morre de amores pelo mestrando em química, eu fico a me
perder na possibilidade ilógica de te deixar mais tranquilo. Enfim, são coisas
da vida...”. Sim, a vida é má. A vida na terra é má. E felizmente está com os
dias contados.
Cheguei nu no quarto do banho e encontrei a gata esparramada no chão
pedindo carinho. Eu que precisava, mas ela disse que também precisa, e que
devemos ficar vivos um pelo outro. Desci para a USP com a mão cheia de merda da
gata para jogar no vaso sanitário.
Consegui ir até lá e fazer o que eu tinha de fazer. Musculação de pernas
e o treino base de dardo. Saí de lá com um lançamento de 37,82m, o que é bastante em um treino de base. Só o que me
atrapalha um pouco é o garoto da FEA que está vindo treinar na mesma hora que
eu. A beleza dele me desconcentra (me irrita um pouco, na verdade).
Ao sair de lá pronto para a competição de sábado e domingo no dardo, eu
pude observar que o esporte não me deixa mais calmo e não me deixa mais feliz
(esse deve ser o objetivo do esporte para mim). Falta pouco. Vou tirar ferias do
atletismo no dia 19. Um mês sem aparecer naquela pista, um mês sem levantar um
peso. Daí eu vou avaliar se continuo se realmente não posso viver sem atletismo
ou se largo e começo a estudar música.
Faltei na aula de literatura brasileira VI. Como disse, estou velho e
decidi que só vou fazer o que eu quero.
Por incrível que pareça ele respondeu. Com aquele “vamos marcar”, mas
disse “baby”. Bem, vamos ver se esse milagre de fato acontece. Daí eu arrumo um
deus para colocar uma moeda no altar, ok?
Não, não ligaram. Os alemães. Mas vão ligar. Para dizer sim ou não, mas
vão. E já me acalmei dizendo a mim mesmo que não cabe a mim quando vão ligar e
o que vão dizer.
É sempre bom esperar o pior.
Em tudo.
Dez de agosto, quinta.
“Não faço revival de Mutantes nem morta! (a não ser por uma boa grana)”
(Rita Lee).
Vou agora assinar a minha rescisão e pegar a minha carteira de trabalho
na Little Jakarta e não piso lá nunca mais (a não ser por uma boa grana). Ainda
tive a grata surpresa de encontrar o Bruninho, o Bruninho; e comer doze
chocolatinhos artesanais dos que eu comia após o almoço.
Ao pensar nos seus dois olhos mágicos e no que você faz, querido
mestrando em química, eu começo a realmente entender o BDSM. Nunca fui tão
submisso, nunca sofri tanto.
Bem provavelmente vou tirar dois dias de descanso antes das competições
de sábado e domingo (eu pretendia fazer musculação de peito e ombros hoje).
Duvido que eu consiga fazer, visto que comprei um litro de uma bela cerveja
alemã.
“O Tapete”. Pensei até em começar um romance com esse nome. Esse nome,
para me ajudar a segurar a barra da falta do homem e de ter que, temporariamente
voltar para casa da minha mãe de novo. Ter um objetivo de ter uma casa para
poder comprar um belo tapete para colocar no meio da sala e sabe para quê? Para
colocar um vestido e cantar gritando, loucaço, com a cabeça cheia de pó e
álcool a música “Trem azul” da Elis Regina, com o sorriso na testa.
“Poema para três garotos e um gato”
Hoje plantei uma semente
Que vai crescer
Ou não
Com meus braços
Que são 2
Que são 2
Para você
Seus números
Seu louro
Seu estúpido;
Eu lanço dardo com o direito
A despeito de você
Hoje eu perdi um olho e
A despeito de você dizer ei man
Eu te digo amem
E não há até logo
Do crucificado com fogo
Da cinza que fica
E da catatonia;
Você me prende aqui
Há oito anos agora
Com oito quilos
Para pegar da areia
O que você põe no pote.
Hoje plantei uma semente
Que vai crescer
Ou não
Com meus olhos
Que são 2
Que são 2
Para você
Suas células
Seu sweet heart
Seu estúpido;
Hoje eu perdi uma perna e
Você já encontrou
Onde você pôs o seu não?
Não é com o meu leite
Que você vai crescer, baby
Thank you, sweet heart;
Eu sei o que você fez com gatos
Quando criança
Mas eu não sou um deles
Agora.
Hoje plantei uma semente
Que vai crescer
Ou não
Com minhas pernas
Que são 2
Que são 2
Passei a tarde
Com gelo na bonita perna
Bonita, vê agora?
Seu desajeitado
Seu lindo
Seu estúpido;
Uma semente de um café
Para começar de novo
Depois de quatro anos agora
Eu perdi meu braço e
Há outros hobbies..;
Mas eu estou aqui, aqui
Com meu mutismo
Não seletivo
Não te troquei pelos telhados
Estou aqui
Com você.
(Hugo Guimarães)
Onze de agosto, sexta.
“I belong, a long way from here…” é o que Sheryl Crow canta enquanto eu
tiro pele morta, escamação dos meus ouvidos.
Não, eu não estou preocupado com a competição de amanhã.
Apesar disso, eu não estou tomando 2mg de risperidona ao invés de 1mg,
de acordo com a recomendação do psiquiatra na consulta do último dia quatro.
Ele disse que a risperidona te deixa “mais lento”. Como estou em um período de
competições importantes que me preparei o semestre inteiro para estar, eu não
posso ficar “mais lento”. Como salário, eu passei boa parte da noite passada
arquitetando o suicídio antes de pegar no sono. O médico aumentou a dose da
risperidona justamente para diminuir os meus pensamentos suicidas. De qualquer
forma eu vou aumentar a dose no dia dezenove como o médico disse. Dia dezenove
é o dia da quarta etapa do TUNA, a última competição do meu primeiro ciclo de
2017. Prevejo férias com muita droga, droga em excesso para o cérebro, álcool e
sono.
O garoto da primeira estrofe, do longo poema acima, decidi que quero um
dominador novo. Vou ficar a semana que vem de castigo sem vê-lo nenhum dia e,
na próxima vou tentar tirar doze palavras dele ao invés de seis.
Doze de agosto, sábado.
É difícil falar sobre hoje, agora que é noite.
Fui logo cedo competir na terceira etapa do campeonato paulista
universitário de atletismo no centro paraolímpico brasileiro (instalações
novíssimas e de excelente qualidade). Era para ser um dia especial, minha
primeira competição pela seleção da USP, mas não foi. A garota da medicina
chegou atrasada com os uniformes e por sorte eu tinha uma regata da FFLCH na
mochila, senão sequer teria competido. A minha prova, e de dois meninos da
medicina começaram cedo, no mesmo horário. A despeito do atraso, a menina
chegou e foi levar uniformes para os meninos da medicina que estavam no
corredor de salto, mas não foi levar para mim que estava lançando dardo. O
treinador não compareceu por compromissos pessoais. A prova? Hum, lancei 37,88m, o que é minha melhor marca universitária
até hoje e me coloca entre os cinco melhores lançadores de dardo da USP. Feliz
só por isso. Essa etapa foi muito mais difícil que a anterior, com a marca que
fiz hoje eu teria ganhado a medalha de prata da série ouro naquela ocasião.
Dessa vez terminei em décimo lugar, veja os resultados: https://drive.google.com/file/d/0B-2EhDVRDmi5Qi1XTXRjcmNMNE0/view Eu iria competir o salto triplo de tarde. Fui
para a arquibancada perguntar para o pessoal da seleção (todos da medicina)
onde estava o uniforme e uma bicha disse “ah, está em uma sacola por aí...”
tipo “foda-se”. Eles me ignoram o tempo todo, como seu eu não devesse dirigir a
palavra a nenhum deles só por que eram da medicina e eu não. Honestamente,
pensei que a seleção fosse uma coisa mais séria. Antes do salto triplo, eu já
me incomodava com o fato de ter que competir com os atletas federados da Unip e
da Unisantana, que saltam quinze metros enquanto eu planejava saltar doze. A
petulância que eles demonstravam já na arquibancada me incomodou a ponto de eu
fingir uma dor no joelho e dizer ao treinador por whatsapp que eu estava indo
embora. Miscreation descansa na santa paz, não quis e não quero incomoda-lo.
Ao chegar em casa vi que ainda dava tempo de ir até o paulista máster
arremessar peso. Tomei uma cerveja e fui. Arremessei 7,53m o peso de 7,26kg. Não foi ruim considerando que não treino
essa prova. Porém com essa marca, eu teria pego a medalha de bronze no ano
passado, mas esse ano o nível aumentou muito e eu precisava arremessar nove
metros para ganhar uma medalha. Fui embora antes da prova acabar, depois vi que
terminei em sexto lugar. Ao voltar do mcdonald’s pensei que hoje não era mesmo
um dia para eu ganhar uma medalha. Tem dia que não é pra ser, é preciso lidar
com isso. Pensei em me aposentar no atletismo enquanto comia aquele hambúrguer
horrível que está conversando comigo até agora. Tive tantas vezes esse
pensamento esse ano que até perdi a conta. É a situação em que me encontro: é
difícil ser rejeitado pelos diferentes de mim e pelos iguais a mim. Ou talvez
ninguém seja igual a mim e eu devo mesmo me isolar, pensei ao ver minha gata em
casa. Pensei em me aposentar amanhã, quando vou ganhar duas medalhas no
paulista máster, no salto triplo e no lançamento do dardo. Seria lindo,
terminar no mesmo lugar onde comecei em 2006, naquela pista sagrada e decadente
do Ibirapuera. Porém agora á noite eu pensei na Darya Klishina. Darya é uma imagem da resistência, única
representante do atletismo russo na olimpíada do ano passado, tendo de competir
com uma bandeira neutra. Ela treina nos Estados Unidos e é controlada por uma
agência antidoping confiável, por isso ela pode competir. Mesmo assim, eu penso
que ela deve encontrar resistência das outras atletas, da torcida, do próprio
país, de todo mundo, só por ser russa e querer exercer o direito de competir.
Darya foi vice-campeã mundial há dias atrás no campeonato mundial de Londres,
que ainda está sendo disputado. Ela fez um salto em distância de sete metros
cravados (o que ela não fazia desde 2013) e subiu no pódio com sua bandeira
neutra.
Esporte é resistência.
Pensei que deve ser resistência para mim também. Que devo ir ao TUNA
daqui a uma semana, aturar o próprio pessoal da FFLCH torcendo o nariz pra mim
(isso se não tentarem me impedir de competir), o pessoal da POLI rindo de mim
por dentro e o pessoal da ECA rindo de mim por fora e mesmo assim estar lá
competindo, resistindo, com uma atitude positivista.
Viver é resistência, aliás.
Quatorze de agosto, segunda.
Ainda estou de ressaca de ontem. De tudo o que aconteceu e dos três
litros de cerveja para comemorar e relaxar. Foi tudo lindo domingo no paulista
máster de atletismo. Tudo deu mais do que certo. A primeira surpresa, logo
quando eu me aquecia para o salto triplo foi a presença da minha querida amiga
Camila, esse ano somamos onze anos de amizade. Ela que filmou o esse salto
triplo que você vê acima. Isso me deu uma motivação para competir melhor, já
que eu tinha torcida, e isso é raro. Mesmo saltando com uma “tábua de impulsão
móvel” (nunca tinha visto aquilo na vida), eu consegui acertar as corridas e os
saltos saíram. Escolhi a tábua de nove metros devido ao baixo nível na
competição e consegui um resultado de 11,78m
(o que é razoavelmente bom para um salto da tabua de nove), o que foi
suficiente para a medalha de ouro. Guardei os doze metros para o TUNA sábado
que vem ;)
O calor estava muito intenso e eu fui já mentalmente cansado para a
prova do lançamento do dardo que começou debaixo do sol das 13h30. As pernas
ainda estavam um pouco pesadas do triplo, que foi ás 10h30. Vi que só tinham
quatro competidores na minha categoria e que eu não tinha que fazer muito
esforço para ganhar uma medalha. Quando fiz meu primeiro lançamento a pouco
mais de trinta e seis metros, pensei “vou parar, já ganhei a medalha mesmo”.
Daí eu pensei em seguida “bom, e melhor ficar torrando no sol lançando do que
ficar torrando no sol parado, não?” E eu me conheço, se vou fazer qualquer
coisa, quero fazer bem. Daí no terceiro lançamento veio a surpresa: 40,36m (o resultado saiu porque fiz o
deslocamento de pernas mais rasante ever e soltei o braço no lançamento com
mais força ever). Eu sabia que eu podia, mas fiquei de fato surpreso. Mais uma
medalha de ouro e se eu não tivesse feito o meu melhor, teria ficado com a
medalha de prata, pois o atleta da Ferroviária que ficou em segundo lançou
38,80m. A vitória foi mais saborosa porque era notável que ele era um atleta
mais experiente que eu na prova e no atletismo (além de fisicamente bem mais
forte e mais alto). Mas ao contrário dele, que ficou reclamando que o dardo era
ruim e velho a prova inteira, eu apenas lancei. Eu adoro dardo velho, tenho a
impressão que eles andam mais hehe
Um pouco bêbado em casa, ainda tive tempo de reclamar dos atletas da
medicina para o treinador da seleção da USP e de ter uma DR com a minha mãe
sobre a minha cabecinha problemática, e acho que DR foi boa.
Agora são 14:42 da segunda-feira e eu já tenho de estar com o sorriso da
miss Venezuela preparado para a minha decisiva entrevista final com os alemães
que acontecerá essa semana.
Quinze de julho, terça.
Ontem tive uma das raras oportunidades de vestir minha camisa cor
mostarda e minha gravata borboleta. Fui ao lançamento do livro novo do Santiago
Nazarian, “Neve negra”. Depois da longa fila, comum em seus lançamentos, eu
disse pra mim mesmo que não ia cometer a gafe de chama-lo de querido ou
abraça-lo, porque o Santiago que eu conheci anos atrás não gostava desse tipo
de coisa, nem em seus lançamentos. Ao me deparar com ele, sorri, disse oi, mas
não estendi a mão e nem esbocei o abraço, apenas permaneci sorrindo. Para minha
surpresa, ele mesmo me abraçou e comentou em seguida: “Te vi outro dia no
metrô, mas não sabia se falava com você, não sabia se ainda éramos amigos”. Eu
disse “que bobagem, você devia ter falado comigo”. Ele ainda me parabenizou
pelas medalhas que ganhei no domingo, foi muito fofo. Só fiquei um pouco
embasbacado pelo comentário dele. Eu sempre quis tê-lo como amigo, mas ele
sempre pareceu “evitar” essa amizade, especialmente depois de um breve
desentendimento que tivemos, depois do lançamento do meu livro “O estranho
mundo” em que eu fiz um comentário em um post dele no facebook me vitimizando
pela minha condição de autor “fracassado”. Ele entendeu que eu o estava
responsabilizando por aquilo de alguma forma e foi até rude comigo no inbox,
disse que o que podia fazer por mim fez, e que sou o tipo de gente que “só sabe
sugar as pessoas”. Lembro que fiquei bem magoado com aquilo, mas não parei de
admira-lo e apoia-lo pois ele foi muito importante na minha carreira de
escritor, foi decisivo para a publicação do meu segundo livro, fez uma
excelente orelha para ele, foi ao meu lançamento, etc. Eu não dei certo porque
não era para dar, mas longe de ser “culpa” dele e muito menos do Marcelino, que
me ajudou tanto quanto. Lembro que depois do lançamento do estranho mundo eu
passei um inbox para o Marcelino reclamando da distribuição do livro,
reclamando de tudo. Ele nunca mais falou comigo. Acho que agora é um momento de
redenção. Agora eu consigo perceber qual é o meu lugar na literatura
contemporânea brasileira e qual é o lugar de autores com o Santiago e do
Marcelino por exemplo. Eles deram certo, levantam a nossa bandeira, seguram a
nossa barra por aí, nos “representam”, a nós os sobreviventes da literatura
brasileira contemporânea. E se há alguém “dos nossos” que ainda lança livro por
grandes editoras, em lançamentos cheios, é mais do que meu dever prestigia-lo.
E outra coisa que me surpreendeu: honestamente, eu esperava um livro quadrado e
comercial, mas não é o que parece ao ler o primeiro capítulo e a dar uma olhada
por cima no miolo. Parece mais um livro de arte do que um livro comercial, o
que é uma grata surpresa. Lerei até o final e comentarei por aqui.
Depois fui ao cinema. A Sofia Coppola refilmou o “The beguiled” do Clint
Eastwood (que tenho em VHS na minha coleção e é um filme que gosto muito).
Sofia contou com nada menos que Nicole Kidman e Kirsten Dunst no elenco. As
expectativas eram enormes. Bem, a refilmagem é quase linearmente igual ao do
Clint com a observação de que Sofia quis dar um olhar feminino ao filme; ou
seja, se no original do Clint, as mulheres eram francamente as vilãs do filme,
colocadas como “monstros” praticamente, aqui elas parecem mais vítimas, vítimas
do amor romântico (O melancólico final é um dos principais retratos dessa
visão). Pelo menos foi essa a sensação. Desnecessário falar da direção
impecável de sempre, do talento da Sofia, do esforço. Dei quatro estrelas e vim
para casa dormir.
Dezesseis de julho, quarta.
Querido diário,
Esse é um longo post de diários sobre a mediocridade da vida e o caminho
tortuoso que me levaram até as minhas stroopwafels.
Eu apenas te disse feliz aniversário e te desejei tudo de bom. Eu já
estava me readaptando a sua ausência. Daí você me responde com três emojis
dando beijinho com coração e me faz passar a tarde sonhando acordado com você
no sofá da minha mãe.
Fui para a casa da minha mãe ontem buscar um pouco de conforto.
Pretendia dormir. Se os alemães não ligam, os americanos ligam e marcam: estive
hoje em uma entrevista para uma multinacional americana de eletrônicos. A
primeira entrevista foi boa, creio que fui bem, mas o fato é que a preocupação
por conseguir um novo trabalho cessou. O que eu realmente quero é ir embora
dessa casa de bruxas e isso vai acontecer de um jeito ou de outro.
Hoje chove muito e eu vou ter que fazer meu treino de dardo para o TUNA
embaixo do velódromo. Se tiver apenas chuviscando de noite, talvez eu lance um
pouco.
Não vou á aula.
Dezessete de julho, quinta.
“E tudo o que ofereço é meu calor, meu endereço...” – são 15h43 e
ouvindo Angela ro ro só escrevo essa hora porque aconteceu um alien, um
Hiroshima, um Chernobyl ontem. Como bom submisso que sou, durante meu último
treino de dardo para o TUNA, passei uma mensagem ao mestrando em química
oferecendo-lhe uma visita de meia hora. E não é que ele aceitou? Wtf? Se não
fosse surpresa o suficiente me pegar ontem á noite percorrendo aquela rua do
arquivo da USP em direção a casa dele, a visita não durou meia hora. Eu queria
que durasse para sempre, claro, mas acabou durando a noite inteira. Estava
frio, ele estava com tosse e a conchinha devia estar gostosa. Quando eu ia
dizer que precisava vir embora (eu não precisava, claro) ele disse “mais cinco
minutos”, daí ele começou a roncar e assim permaneceu até ás 09h15 de hoje.
Coitadinho, deu pra perceber o quanto ele estava cansado. Não deve ser fácil
estar no mestrado, trabalhar o dia todo naquele laboratório. Eu que empurro
minha graduação com a barriga não tenho ideia de como é. Mas voltando ao
assunto, realmente surpreso por vê-lo, tê-lo de novo nem que seja por uma
noite. Pensei que ele só tinha voltado a falar comigo porque ele não consegue
evitar em ser tão doce, que ele iria enrolar e enrolar, que nunca mais nos
veríamos. É, mais uma vez eu estava errado. “Como sempre você está errado,
Hugo” era o que sempre dizia o meu ex-namorado.
O que quero da vida agora? Vê-lo de novo? E depois? De novo e de novo?
Vou sempre ter a dúvida se haverá o “de novo”? Sim, eu devo ser o maior dos
pessimistas. Porém, ao voltar da casa dele aproveitei a felicidade para passar
no Kentucky Fried Chicken, passar na livraria cultura e comprar finalmente o
DVD do “Audition”, clássico de terror do Takashi Mike, que absurdamente eu
ainda não vi (eu que sou um colecionador de filmes de terror). Meus próximos
objetivos agora são: sair de casa nessa chuva e nesse frio para treinar salto
triplo hoje, vê-lo de novo, competir bem o salto triplo e lançamento do dardo
no TUNA este sábado, conseguir um emprego novo até o fim deste mês e se
conseguir, passar um fim de semana na praia.
Dezoito de julho, sexta
Eu não consegui descer para a USP ontem para fazer o meu treino de salto
triplo. Eu estava muito triste. Eu sei por que, mas não quero dizer. O máximo
que pude fazer pelas minhas pernas foi escorregar na calçada ao ir para o
mercado comprar cerveja. Sim, um pouco de álcool para potencializar o efeito do
remédio para dormir, para relaxar um pouco. Consegui lavar minhas camisas para
usar nas minhas entrevistas de trabalho na semana que vem. Não consegui jantar.
Fiquei comendo Elma chips com Heineken
ouvindo o “Bachelor nº2” da Aimee Mann que, eu não lembrava que era tão bom.
Consegui dormir cedo assim. Fui dormir com a cueca preta que vesti anteontem do
lado do meu travesseiro, para ficar cheirando ela, que ainda está com o cheiro
do mestrando em química.
Vou me sair bem amanhã e tudo bem se eu não me sair. Ganhei minhas
medalhas no estadual master, garanti minha convocação para a seleção da USP do
ano que vem no lançamento do dardo. O que vier amanhã é lucro, é só para fechar
bem meu 1º ciclo de 2017 e começar a gozar as minhas duas semanas de férias.
Preciso sair hoje para sacar o FGTS que a little Jakarta depositou para
mim, para pegar a receita fria de sibutramina para a minha sobrinha, para ir á
aula de literatura brasileira VI.
Antes, vou dormir por uma hora, após ter feito minha primeira refeição
do dia, como tornei hábito.
Dezenove de julho, sábado.
Depois de anos, a minha gata tomou um banho ontem.
Bobo. Apenas bobo pelo que aconteceu hoje. Eu tenho uma medalha do TUNA,
a mais doce das minhas stroopwafels até agora. Tenho e com uma grande marca. Ganhei
derrotando o melhor saltador da faculdade de medicina da USP, derrotando todos
os saltadores da escola politécnica (hoje foi o meu dia de rir de vocês, mas
como um autêntico gentleman que sou eu não o fiz), com um salto de 12,50m que me faz o quarto melhor
triplista da USP este ano. Bobo, apenas bobo.
Eu esperava saltar 11,67m para entrar no ranking dos 10 primeiros da
USP, pensava que era possível porém difícil ultrapassar os doze metros e
percebi o quanto eu subestimo a mim mesmo, o quanto eu sou adversário de mim
mesmo. Tão bobo que nem fiquei para lançar o dardo, que seria ás 15h00. It was
you, Darling – acho que a mágica noite de quarta-feira me renovou, me deu
forças para esse feito.
Agora vou tirar merecidas duas semanas de férias.
Desculpe te desapontar se você esperava um final triste, mas já houve
tristeza o bastante por aqui não?
XOXO
Um comentário:
Hugo, que sauna você frequenta? Quero ter a sorte de te encontrar
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