31 de mar. de 2014

"OU / ATÉ QUE"

hugo guimarães aos 50:
“finalmente começaram a ler meus livros, finalmente começaram a me encher o saco”.
ou
“por mais que o mundo diminua a cada dia, ele ainda é maior que o seu homem”.
ou
“até não saber o que dizer. até eu mal poder ajoelhar para recolher os dvd’s que minha gata derrubou da prateleira. até por o direito deles estar inchado devido aos saltos estranhos que eu faço. até que sim, eu sei que estar indo atrás de outra medalha e ganhá-la, não me fará uma pessoa melhor. até que sim, passar alguns meses na academia fortalecendo os músculos até que eu consiga levantar 100 quilos no agachamento para que eu possa ganhar outra medalha em novembro não vai me fazer uma pessoa melhor. até que sim, sei que esportes substituem os psicotrópicos, sei que manter o corpo saudável diminui a sensação de estar apodrecendo. até que sim, passei a acreditar na tese, ou teoria, ou que, de que o corpo já sim começa a apodrecer a partir do nascimento e não somente após a morte. até que eu posso questionar o envelhecimento das células contra a renovação. elas morrem. então o processo de apodrecimento já está iniciado quando nascemos; a supor. até que sim, a célebre frase da purificación santamarta (google it) ‘uma medalha vale o mesmo que uma tampa de gatorade para mim’ estende-se até a linha do significado da vida; mesmo – até que sim, a minha posição na sociedade – a minha posição na sociedade e qual a minha posição na sociedade – eu tenho uma posição na sociedade? até que sim, ao derrubar barreiras, ao acumular, até que finalmente, até que nunca posso esquecer de que nunca vou parar de seguir para bater a cabeça bem de frente com a morte e que nada posso fazer a. até que sim, ou não, não quero falar sobre isso, sobre a abreviação da vida mais uma vez visto que. sim, já falei muito sobre isso”
ou
“não sou terrivelmente feliz, mas não sou o coitado que as pessoas pensam”
ou
“até que o que me impede a, nesse momento, é o medo de altura”.
ou
“até que não, a utilização da crase não é indispensável. até que ela é apenas uma fusão. Até que sim, fui aceito pela faculdade de filosofia, letras e ciências humanas da universidade de são paulo. até que mal consigo sair da cama aos finais de semana. até que não consigo lavar as louças ao ponto de que só lavo uma peça quando todas as demais estão sujas. há sempre sacolas plásticas vazias e amarradas dentro da pia que foram utilizadas para compressas de gelo nos meus joelhos. elas me causam má impressão. até que sim, tenho nojo de cozinhar na minha cozinha amarela. cozinhas devem ser brancas. não vou pintar a cozinha de branco porque essa cozinha não é minha e não quero ter de pintar de amarelo de novo quando eu for embora desse maldito apartamento, afinal eu mal tenho ânimo para levantar da cama no pouco tempo que consigo ficar aqui. até que sim, todos esses fatos estão diretamente ligados”
ou
“não consigo entender que a USP é uma casa de tantas cabeças produtivas, tanta produção intelectual e é um lugar onde haja tantas árvores... você consegue ligar essas duas informações? afinal, a impressão de um livro consome x páginas, logo não deveria haver árvore alguma na USP”
ou
“ser escritor e nunca para de escrever é a aceitação da inabilidade de conseguir dizer o que pensa ou o que acha. por isso os escritores morrem escrevendo, tentando atingir tal habilidade, morrendo sem nunca explicar coisa alguma”.
ou
“odeio os dois livros que publiquei”
ou
“a impressão do livro não garante a imortalidade. ela é apenas carimbo, uma etiqueta. muitas edições se perdem ao passar dos séculos. se perdem para sempre. a internet também vai acabar, não duvide disso. a impressão apenas facilita que outras pessoas, outras gerações futuras mantenham reimprimindo os livros se você for digno de algum tipo de idolatria, ou respeito. o escritor por si só não pode fazer nada para que essa continuidade ocorra”
ou
“não vou fazer quase nada este ano. quase nada”
ou
“fiz tudo exatamente ao contrário, por isso vivo a margem da sociedade. ou eu deveria escrever ‘á margem da sociedade’? descobri que a crase não é indispensável, descobri isso na própria faculdade de filosofia, letras e ciências humanas. só não consegui descobrir por quê o prédio da filosofia fica tão longe do prédio da letras e da geografia e da história. até que sim, este ano não darei entrevistas. nem nesse nem nos próximos nem jamais. a última que dei foi para o gabriel marchi do site ‘a virgula’, em novembro do ano passado. entrevista essa que jamais será publicada, devido a sempre, absolutamente sempre, a cada segundo, haver algo mais legal a se dizer e ao se publicar sobre, do que o livro de contos do hugo guimarães. até que sim, vou participar de uma coletânea de contos chamada ‘a puta ria’ que está sendo organizada pelo luis rafael montero e que é uma antologia de contos sobre prostituição que tenham humor, onde pela primeira vez estou fazendo um texto sob encomenda. até que sim, outro amigo me chamou para algo que não sei bem o que é. até que o ‘doamsepalavras.com.br’ deve perdurar. até que sim, este ano os dois curtas-metragens em que atuei serão lançados [veja amostra abaixo]


ate que sim, estou quase terminando meu romance. até que sim, eu esperava criar uma história com um herói para ser comercial, mas acabei criando um livro de literatura experimental que também é um livro de filosofia. até que sim, vou inscrever em dúzias de editais e concursos. até que não, não consigo conter a desconfiança de que um dia serei ouvido, lido, ou respeitado”
ou
HE’S STRAIGHT
IF HE’S GAY
HE HATES
ME
(THIS IS NOT A POEM, THIS IS A TATOO)
ou
“o homem apenas pode lhe oferecer a ilusão de que ele é maior do que o mundo, mas. (veja o verso dois)”
ou

XOXO.

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