19 de jan. de 2020

PRIDE


#Trecho

Um louco motorista dobrou a Oscar Freire em alta velocidade e podia, podia parar, mas acelerou mais, para atropelar os comunistas de propósito. Tudo fora carregado como neve, mas como lixo ao invés de neve, entende? Mas eram cadeiras, salsichas, pernas humanas, braços, sapatos, sangue, pele queimada, pele arrastada pelo asfalto de uma forma que o asfalto gruda na pele, e você sabe como as enfermeiras tiram asfalto grudado na pele no hospital? Pois nem queira saber. Enquanto o trator de neve tentava empurrar toda aquela sujeira da frente, eu disse “é meu ônibus”. Gritei “espere!” e corri até a porta do ônibus. Bati na porta três vezes além de gritar. O motorista facínora abriria a porta muito mais facilmente para uma bela moça. Ele abriu a porta enquanto já esbravejava coisas como “esses putos vadios!”. Eu já desisti de argumentar com motoristas de ônibus, taxistas. Pensei “termine logo de empurrar o lixo e me leve para a faculdade”. Estômago; precisa estômago para viver uma situação onde o caos pode não justificar, mas explicar crimes e desentendimentos.

Aveia e proteína isolada.

Um rapaz bem vestido no ônibus, branco, com óculos de lentes redondas disse um tanto assustado “eu nunca tinha visto uma fratura exposta antes”. Sentei-me bem ao lado dele. Sentindo algo da raiva e apatia no coração bem sendo já costurado com agulha e fios, melado e gosmento; nojento, mas ficando curado, lá eu estava ao lado do rapaz, com a cara da Cyborg, a lutadora. Quando eu adentro o transporte público, sempre me sento ao lado da pessoa mais bonita. E você?
“Você sabe o que é pior do que uma fratura exposta?” o rapaz diz não e eu “fratura exposta na chuva”.

A gift:
St. Loius Blues, Billie Holiday




XOXO


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