18 de jul. de 2021

CACOS E SANGUE

 


Não adianta me mandar ir tomar banho

Lixo fede mesmo

 

Tá feliz com o Marlboro?

Com sua boca podre?

Com o quanto suas roupas fedem?

 

Três anos preso

Sem horizonte

Da data do julgamento

 

Não precisa mais

Me falar “Ponha-se no seu lugar”

Eu não quero mais

Ser pai de ninguém

 

Minhas meias são furadas

Todas

Eu não corto as unhas do pé

 

Ouço a novela por tabela

O personagem trans

É o “resto”, é a “caridade” da novela

 

Beija-me

Quero sentir o seu chorume

Beija-me

Senão eu morro de chorume

 

Legal

Agora a boceta de ouro

Tem que escolher entre dois machos lindos

 

Quer saber?

Eu ia sofrer um ataque homofóbico

Mas não teve agressão

Teve briga.


XOXO

12 de jul. de 2021

UM TEXTO ACADÊMICO PARA SAMUEL



 Isso é guerra. Não a segunda guerra que tanto incomodava o Drummond, mas isso é guerra. Drummond, em sua época, em que essa guerra não era guerra, pois quando não há defesa, não há luta, é genocídio, e Drummond, à frente de sua época, nos dava o poema “Rapto” que compõe o livro “Claro Enigma”, não é dessa vez que vou poder analisar “Rapto”, mas é dessa vez que posso introduzir o que significa esse rapto.

O poema citado, todos bem sabem do que se refere. Hoje evoluiu da escuridão de não poder mostrar suas cores, quando o mundo se levantava em fumaça para uma luta do monocolorido contra o colorido. Faz dois dias. Samuel foi espancado até a morte apenas por ser gay. É atestado que sete homens o espancaram, mas investiga-se que podem ter sido doze, quando um só era o suficiente. Me parece pouco resistível não citar Clarice Lispector e seu conto “Mineirinho”, ele, o protagonista foi assassinado com treze tiros de metralhadora por seus crimes. “Até que treze tiros nos acordam, e com horror digo tarde demais — vinte e oito anos depois que Mineirinho nasceu – que ao homem acuado, que a esse não nos matem. Porque sei que ele é o meu erro. E de uma vida inteira, por Deus, o que se salva às vezes é apenas o erro, e eu sei que não nos salvaremos enquanto nosso erro não nos for precioso. Meu erro é o meu espelho, onde vejo o que em silêncio eu fiz de um homem. Meu erro é o modo como vi a vida se abrir na sua carne e me espantei, e vi a matéria de vida, placenta e sangue, a lama viva.”¹

Os assassinos não sabem, não enxergam o que é o erro. O erro de Samuel, ele bem soube, enquanto ouvia um não sei quanto de proferimentos da palavra “Maricon”, um termo pejorativo para a palavra homossexual. Talvez ainda teve tempo de se perguntar: “Estou mesmo na Galícia?”. O erro de Samuel foi existir, como uma baleia existe nos mares do Japão e morrem, morrem, mesmo com leis de proteção. A vida de uma baleia vale mais do que a de um LGBT e se não discutirmos, continuar lutando pelo direito de ser mais suscetível a violência e assassinato do que uma baleia japonesa, então não sei o que estamos fazendo aqui, na Faculdade de Filosofia, Letras e ciências humanas da USP, onde há mais LGBT por metro quadrado do que em qualquer faculdade do Brasil e não, não é inadequado introduzir um texto acadêmico com devidas citações de heróis da nossa literatura com o mundo, a realidade, os erros e as cores que nos rodeiam.

Porém, há dois dias acendeu-se uma luz, uma nova vela. Durante o Campeonato Europeu de futebol masculino que acabou ontem, houveram diversas manifestações pró LGBT em vários lugares da Europa, praticamente a Europa civilizada inteira, uma resposta à uma lei aprovada na Hungria durante o campeonato que proíbe que o assunto homossexualidade seja citado nas escolas primárias do país, a mesma lei que já existe na Rússia. Na partida em que a Alemanha recebeu a Hungria em Munique, uma maioria massiva dos torcedores foram ao estádio com as cores do arco-íris, todos os principais estádios da Alemanha foram coloridos com as cores do movimento.

Mas, exatamente na Europa, onde crimes de ódio contra homossexuais não são comuns, a sociedade odiosa, genocida mostrou seus músculos na Espanha. É um pouco difícil combater músculos com cores, mas as cores não morrem.

¹(Fonte: http://www.ip.usp.br/portal/  , do livro: Para não esquecer. São Paulo: Ática, 1979)

XOXO

10 de jul. de 2021

CLASSIFICADOS

 


Tudo tem limites

Ao contrário do que eu pensava

Acho que os remédios

Que anulavam a minha libido

Não são mais os mesmos

Aguentei um ano e seis meses

Sem o toque de um homem

Meu celular quebrou

Meu notebook quebrou

Minha vida quebrou

Ao que primeiro

Meu cérebro começou

A escorrer

Ao contrário do que eu pensava

É ele que escorre

Pelo meu nariz

Não é o cigarro

 

Iniciei conversas

Com três homens

Qualquer um deles serve

O cheiro da porra do outro

 

Meus pais não sabem

Que me confinam em uma zoomorfização

Mas eu sei

 

Eu sou a versão pobre da Brittney Spears

Porém eu sou livre

Mas eu não sei para onde ir

Além dessas grades quebradas

 

Mas meu lábio inferior

Está um pouco vermelhinho

Parece sangrar

Levantei a camiseta hoje de manhã

Preciso de uma dieta

E ainda assim

Contatei mais homens

 

Até que aqueles senadores todos

Falam português muito bem

A indagar

Um chiwawa

 

O gatinho de sorriso deslumbrante

Tão curioso com meus stories

Não parou de ganhar músculos

Enquanto eu fumava

 

Porém, retomar uma vida

Sem glúten, sem açúcar e sem leite

É difícil

Não é fácil

 

Sim, na premier do meu “O Estranho mundo”

Aqueles dois cocôs do Jabaquara

Que pensam que são artistas

Chegaram a combinar um ataque

Na minha premier

Quem precisa atacar, está perdendo

Eu apenas daria o cotovelo

Como Holly Holm

E chamaria a segurança

Para manda-los vaso abaixo

Porque vocês são dois cocôs

Vocês parecem dois cocôs.


XOXO




4 de jul. de 2021

PGU

 


Meu primeiro livro “Poesia gay underground: história e glória” (ed. Annablume, 2008) continua a ser lido...

PS: não fui eu que tirei essa foto.

 

***

 

Sim, ele que é um produto do “do it yourself”. Anos antes eu juntava cinco poemas impressos e distribuía de mão e mão na faculdade, como os criadores de zines faziam nos anos 1990. De repente, pensei em um livro. Juntei todos esses trabalhos independentes com poemas inéditos para dar liga e lá estava ele, Poesia gay underground história e glória.

 

***

 

Hoje, esgotado em livrarias. Só é possível encontra-lo em alguns sebos listados no site Estande Virtual e claro: diretamente comigo (o mais recomendado), assim você compra seu livro novo com dedicatória e autógrafo.

 

***

 

Faz treze anos. Já foi tema de artigo acadêmico, já foi chamado de clássico, foi parar na Universidade do Texas, foi parar até em Harvard. A Amazon o vende no mundo inteiro, na Espanha, no Japão.

 

***

 

Faz treze anos, mas lembro como hoje. O editor que sentiu amor à primeira vista ao me ver pessoalmente pela primeira vez e eu só fui descobrir depois. Certo dia ele marcou uma reunião comigo depois do expediente quando todos já haviam ido embora. Quando cheguei lá o encontrei com uma garrafa pela metade nas mãos. Quando entrei ele enfiou a mão no meu traseiro. Fizemos sexo entre pilhas de livros. Eu tinha segurança sobre a qualidade do meu texto, claro, mas se não fosse aquele interesse sexual, será que eu seria publicado tão fácil? E não era só sexo, ele queria algo a mais, quando viu que não teria, começou a me tratar mal, mas aí o livro já estava sendo impresso...

 

***

 

Faz treze anos, mas lembro como hoje. O lançamento do livro na Livraria da Vila da Alameda Lorena. Meus amigos loucos secando todo o álcool do buffet, deitando na mesa para tirar foto. Foi a primeira vez que soube o que era um caroço: meu “amigo” hétero e fascista com sua namorada foram ao lançamento, não compraram o livro, cometeram a gafe de pegar o livro de amostra da mesa e ficar foleando/estragando o livro em um dos sofás. Meu ex-namorado me contou depois, mas eu cheguei a perceber de rabo de olho: Ele ficou rindo de mim o lançamento inteiro e depois reclamou que eu não o convidei para o lançamento do meu segundo livro.

 

***

 

Analise você mesmo: o seu amigo mais idiota é um hétero e você deve se livrar dele o mais breve que você puder.

 

***

 

Faz treze anos, mas me lembro como hoje. Tomei o caminho sem volta da literatura

 

XOXO


28 de jun. de 2021

PRD



É só ouvir a palavra "escolha" nos comerciais que o pão já me sobe à goela. Ninguém escolhe nada. Ninguém escolhe ser preterido, marginalizado, julgado por quem sabe menos que você, sofrer bullying, sofrer violência psicológica em uma sociedade onde isso é crônico, morrer tanto o quanto plantou-se um câncer, morrer na Autobahn tirando o pé. Ninguém escolhe NADA, nem o intruso que usa essa tese, nem o próprio lgbt que acredita nela. Não, ninguém escolhe. Alguém tem o direito de se definir como quer e dizer que "escolheu" ser gay? bem, há o direito de ser desavisado. Ela casou, teve filhos e agora "escolheu" se relacionar com uma mulher? Não, ela já tinha o desejo de estar com essa mulher dentro dela e se não fosse por essa, seria por outra. Todo mundo nasce com uma pulseira e lá está escrito em detalhes o que você é e você não pode mudar isso. Lembram-se que a palavra "escolha" dá ao homofóbico a vertigem de que essa palavra é como escolher uma distração, um êxtase? Então, se é só uma questão de prazer e não de identidade, fica mais difícil o respeito entrar e as consequências todos nós sabemos. O conceito de "escolha" mata e nós devemos abrir os olhos.

***

Adeus 24. Você foi um bom ano para as garotas.

24 é o número que a sociedade costuma relacionar aos homens gays. Não toda a comunidade lgbt, mas apenas aos homens gays. Como sabem, toda doença tem um código com sigla e número, e o número 24 é o código da infecção por HIV. Isso sempre fez as pessoas acharem que os homens gays são culpados pela existência e pela disseminação do vírus pelo mundo. Muitos gays são agredidos por isso. Muitos gays morrem por isso, o que caracteriza o tamanho da gravidade. Alguns usam esse número para brincar com gays sem saber o que isso representa e muita gente usa para ofender mesmo. Portanto, esse número não me representa e não deveria representar nenhum homem gay. Times de futebol não usam a camisa nº 24 por ser por "pejorativo".
Voltando á origem: A C.I.A. matou Jimi Hendrix, Jim Morrison e Janis Joplin porque estavam já achando perigosa a atitude rebelde, transgressora e liberal dos jovens da época e deram o mesmo jeito de acabar com os gays criando um vírus mortal, sem cura em laboratório nos E.U.A. (não duvidem disso) e espalharam o vírus por todas as áreas gays de São Francisco e Los Angeles. Eles só esqueceram de prever que muita gente hétero hipócrita hostiliza gays, mas transa com gays, o que espalhou o vírus para todo o resto da população. Portanto, nós homens gays também somos vítimas e não devemos carregar essa culpa.

Adeus 24. Você foi um bom ano para as garotas.


XOXO